É curioso observar o quanto
certas atitudes estão tão integradas ao nosso viver que nem nos damos conta de
que as tomamos. Algo que é preciso que levemos em conta para ponderar sobre
este tema é a questão daquilo que nos move.
Somos movidos por impulsos
inconscientes, mesmo em ocasiões que julgamos estarmos verdadeiramente
expressando uma opinião pessoal. Sim a
opinião nos pertence mas temos algo em nós que nos impulsiona a expressar esta
opinião e igualmente nos levou inicialmente a concebê-la.
Deixemos claro que este texto não
consiste em uma crítica, mas muito mais uma constatação. Mesmo porque eu mesmo
já sucumbi a estes mesmos impulsos diversas vezes e fosse criticar esta conduta
então esta seria uma auto-crítica.
O tema abordado aqui diz respeito
a algo que observamos constantemente nos meios de comunicação em especial na
Internet, quer seja por escrito em fóruns de debate, em Blogs, quer seja
através dos Vlogs do Youtube, ou ainda, em discussões e debates televisionadas.
Trata-se de um recurso sutil
utilizado para se prevalecer em debates, pelo qual se toma como bandeira
valores e conceitos inquestionáveis, inatacáveis, contra os quais obviamente
ninguém seria contrário.
Assim vemos egos se inflando como
se solidez do tema abraçado realmente lhe pertencesse. Imaginemos aqui alguns
exemplos, pois tal tática de debate é muito observada em nosso meio, então um
indivíduo faz algum comentário sobre determinado assunto dentro de algum
contexto específico como por exemplo tratar sobre entidades desencarnadas.
De pronto algum Paladino do Óbvio
virá questionar ao interlocutor quanto a provas, argumentará com comprovações
geralmente científicas de que houveram espíritas charlatães que forjaram
aparições fantasmagóricas, lembrará que já foram feitos testes científicos
pelos quais se conseguiu reproduzir o efeito da sensação de levitação e visão
de um túnel luminoso como geralmente é relatado em experiências de quase morte,
atribuindo tais fenômenos a um efeito eletroquímico do cérebro, já que através
de estímulos elétricos se obteve resultados semelhantes.
Em geral, tais argumentações são
incontestáveis, inquestionáveis e quem se vale delas se infla e assume uma
postura de superioridade absoluta, que lhe dá uma sensação muito prazerosa de poder.
O que este valoroso defensor da lógica, da sanidade mental e do bom senso não
se apercebe é que tais informações podem ser bastante contundentes por si só,
mas elas não fazem com que ele por reproduzí-las tenha qualquer uma dessas
qualidades observadas na informação em si.
O que ocorre por de trás das
palavras, é um jogo de poder entre personalidades, que expressa características
bastante primitivas de nossa dinâmica social, sendo que tais estratégias são
observadas em linguagens não verbais em primatas, como no caso de chimpanzés
que demonstram sua superioridade frente ao bando se colocando no galho mais
alto de uma árvore na qual o bando esteja. Estar no galho mais alto faz daquele
indivíduo superior aos demais? Faz dele mais forte? Faz dele mais inteligente?
Faz dele mais alto? Não, não e não.
O galho é alto e não o chimpanzé,
da mesma forma que o uso de um argumento tido como forte não faz do indivíduo
um melhor debatedor e nem faz com que suas idéias sejam superiores, ou mais
inteligentes, ou mais criativas ou melhor elaboradas que as do interlocutor.
Geralmente esse galho escolhido
será um galho que ninguém irá questionar ser o mais alto, mas isso faz com que
os outros galhos daquela árvore sejam mais fracos? Menores? Mais velhos? Mais
quebradiços? Não... O galho mais alto é apenas mais alto. Da mesma forma que o
argumento mais sólido é apenas mais sólido, de modo que tudo o mais na dinâmica
do debate nada mais é que uma série de manobras com o objetivo não de se chegar
a uma conclusão, mas sim de enaltecer o argumento utilizado, mesmo que ele diga
pouco ou mesmo nada quanto ao contexto do que está sendo debatido.
Retomando o exemplo das entidades
desencarnadas, dizer que havia espíritas charlatões significa que o
interlocutor estava realmente dizendo que isso não fosse um fato? Dizer que
pessoas passem por experiências espirituais em casos de "quase morte"
significa que se esteja afirmando que tais fenômenos não possam ser
reproduzidos com estímulos cerebrais? Mais uma vez as respostas são negativas.
O que geralmente se observa nessa
conduta própria dos "grandes debatedores" é apenas e tão somente
escolherem aquilo que é óbvio. E esse é um grande desafio para aqueles que
ousam tentar transcender o óbvio, pois o óbvio já é conhecido, já é sabido, já
está comprovado, então se quisermos transcendê-lo devemos lançar novas
propostas, que ainda não foram testadas, que ainda não foram comprovadas,
tratar sobre o que ainda não é sabido, nem conhecido e muitas vezes nem aceito.
O fato de se tratar de algo que
não seja óbvio não significa como querem fazer parecer os Paladinos que se
esteja cometendo a estultice de negar o óbvio, de contradizer o óbvio, pois se
há algo que é indubitavelmente óbvio é que negá-lo é algo sem sentido que muito
provavelmente o interlocutor mais ousado não estará fazendo.
O modus operandi de um Paladino do Óbvio é o de defender aquele
conceito já bem conhecido, aceito por todos e bem estabelecido, como se este
estivesse sendo atacado apenas pela apresentação de algo que trate de assuntos
que o conceito defendido não abarque. Como por exemplo se o assunto for
violência, a postura do Paladino será a de se mostrar veementemente contrário à
violência, indignado com a violência, pois essa é a posição mais óbvia e é
sabido, universal e aceito por todos que a violência é algo a ser repudiado,
mas isso não detém o Paladino, que estará levantando a bandeira da
Não-Violência como se existisse alguém que estivesse fazendo uma campanha a
favor.
Tudo que já se sabe sobre a
Violência está bem estabelecido, bem como a postura de todos com relação a ela,
mas porque ela ainda existe? Será que ela não seria algo natural no ser humano?
Mas se eu faço esse questionamento para um Paladino do Óbvio ele
automaticamente já irá me cobrir de provas de que a Violência é algo
reprovável, vai se indignar que eu considere a violência uma coisa boa... Opa
opa opa... Pera aí... Ao dizer que é algo natural eu estava dizendo que era
algo bom?
Estou certo de que com esses
exemplos o caro leitor já deve ter se lembrado de vários indivíduos que se
encaixem no perfil descrito até aqui, podendo inclusive o próprio caro leitor
constatar já ter feito uso, assim como eu, deste subterfúgio.
Como disse não se trata
exatamente de uma crítica, mas o que podemos observar é que tal postura poderia
ser classificada como anti-esportiva em um debate, limitando os temas àquilo
que já estamos todos cansados de saber e de discutir, refreando assim qualquer
iniciativa de se ousar em pensar além do óbvio.
Entendamos que este texto consiste
apenas numa análise de comportamento e uma forma de ilustrar o tema central que
consiste numa observação sobre as forças que nos movem, que movem nossa mente e
até mesmo nossas emoções e ações. Forças invisíveis que se encontram em cantos
obscuros de nossa psique, nos
trazendo inicialmente um impulso instintivo básico que somente depois ao se
manifestar é que vem a se tornar mais elaborado e complexo assumindo uma grande
variedade de formas e maneiras de se mostrar.
Nossas personalidades que seriam
o conjunto do que manifestamos em nossas ações, pensamentos, reações e emoções
é composta pelo o que se chama de quaternário inferior, sendo ela composta
pelos quatro corpos mais densos de nossa anatomia oculta, sendo eles o físico
denso, o físico etérico, o astral e o mental concreto.
Da mesma forma que expressamos
nossa personalidade na realidade material do plano físico denso, igualmente a
nossa individualidade a partir do mental concreto se manifesta em nossa
personalidade definindo o nosso senso de particularidade promovendo os impulsos
iniciais para a auto-manifestação.
Nesse processo se dá que a nível
emocional e no campo dos pensamentos, domínio esse pertinente ao plano astral,
nos vemos em eterna busca do equilíbrio entre duas tendências opostas, sendo
essas representadas por dois aspectos básicos do tatwa Apas, bem como pela
interação entre os Sephiroth Hod e Netzach.
Sendo que um nos impulsiona à
aglutinação, à comunhão e confraternização para com os iguais, e da mesma forma
nos impulsionando a assumirmos identidade e identificação com esses iguais, nos
abstendo de tudo que venha a nos distinguir do grupo ao qual buscamos nos
integrar.
O outro impulso nos leva a
distinção, à separatividade, a buscar reforçar a particularidade, nos
distinguindo dos que nos são semelhantes, enfatizando o sentimento de
especialidade, nos levando a buscar ser exclusivos, diferentes, especiais e de
preferência superiores. Embora nem sempre esta última questão seja uma
constante, pois muitas vezes este impulso se manifestará na tendência de nos
sentirmos satisfeitos em sermos distintos por exclusão, como o mais perseguido,
o menos afortunado, mais humilde etc.
Tais impulsos nos levam em última
análise a optar entre a qual estaremos cedendo a cada ocasião. Existem aqueles que
optam por um mais constantemente que por outro e essa dualidade é base
essencial dos conflitos humanos, em que estaremos sempre assumindo uma postura
ou outra com relação ao outro.
Aquilo que no campo das idéias
poderia ser compreendido apenas como uma preferência pessoal, um traço de
personalidade, no campo das emoções e dos impulsos instintivos é que se mostra
uma realidade mais profunda e marcante, de modo que sentimos uma atração
intensa ora por um ora por outro dos impulsos sendo essa uma escolha entre o
que lhe dá a sensação de prazer, de estar do lado "certo", ou aquilo
que lhe dá a sensação de poder, de não estar com aqueles que se acham
"certinhos".
Deste ponto em diante esse já se
torna um outro assunto que pretendo abordar em textos futuros. Por hora espero
que o exposto tenha levado a que ao menos não venhamos a julgar tão rapidamente
quem não fala o que é óbvio, pois muito raramente ele estará questionando o que
é óbvio mas sim buscando apenas superá-lo.