quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Paladinos do Óbvio


É curioso observar o quanto certas atitudes estão tão integradas ao nosso viver que nem nos damos conta de que as tomamos. Algo que é preciso que levemos em conta para ponderar sobre este tema é a questão daquilo que nos move.

Somos movidos por impulsos inconscientes, mesmo em ocasiões que julgamos estarmos verdadeiramente expressando  uma opinião pessoal. Sim a opinião nos pertence mas temos algo em nós que nos impulsiona a expressar esta opinião e igualmente nos levou inicialmente a concebê-la.

Deixemos claro que este texto não consiste em uma crítica, mas muito mais uma constatação. Mesmo porque eu mesmo já sucumbi a estes mesmos impulsos diversas vezes e fosse criticar esta conduta então esta seria uma auto-crítica.

O tema abordado aqui diz respeito a algo que observamos constantemente nos meios de comunicação em especial na Internet, quer seja por escrito em fóruns de debate, em Blogs, quer seja através dos Vlogs do Youtube, ou ainda, em discussões e debates televisionadas.

Trata-se de um recurso sutil utilizado para se prevalecer em debates, pelo qual se toma como bandeira valores e conceitos inquestionáveis, inatacáveis, contra os quais obviamente ninguém seria contrário.

Assim vemos egos se inflando como se solidez do tema abraçado realmente lhe pertencesse. Imaginemos aqui alguns exemplos, pois tal tática de debate é muito observada em nosso meio, então um indivíduo faz algum comentário sobre determinado assunto dentro de algum contexto específico como por exemplo tratar sobre entidades desencarnadas.

De pronto algum Paladino do Óbvio virá questionar ao interlocutor quanto a provas, argumentará com comprovações geralmente científicas de que houveram espíritas charlatães que forjaram aparições fantasmagóricas, lembrará que já foram feitos testes científicos pelos quais se conseguiu reproduzir o efeito da sensação de levitação e visão de um túnel luminoso como geralmente é relatado em experiências de quase morte, atribuindo tais fenômenos a um efeito eletroquímico do cérebro, já que através de estímulos elétricos se obteve resultados semelhantes.

Em geral, tais argumentações são incontestáveis, inquestionáveis e quem se vale delas se infla e assume uma postura de superioridade absoluta, que lhe dá uma sensação muito prazerosa de poder. O que este valoroso defensor da lógica, da sanidade mental e do bom senso não se apercebe é que tais informações podem ser bastante contundentes por si só, mas elas não fazem com que ele por reproduzí-las tenha qualquer uma dessas qualidades observadas na informação em si.

O que ocorre por de trás das palavras, é um jogo de poder entre personalidades, que expressa características bastante primitivas de nossa dinâmica social, sendo que tais estratégias são observadas em linguagens não verbais em primatas, como no caso de chimpanzés que demonstram sua superioridade frente ao bando se colocando no galho mais alto de uma árvore na qual o bando esteja. Estar no galho mais alto faz daquele indivíduo superior aos demais? Faz dele mais forte? Faz dele mais inteligente? Faz dele mais alto? Não, não e não.


O galho é alto e não o chimpanzé, da mesma forma que o uso de um argumento tido como forte não faz do indivíduo um melhor debatedor e nem faz com que suas idéias sejam superiores, ou mais inteligentes, ou mais criativas ou melhor elaboradas que as do interlocutor.

Geralmente esse galho escolhido será um galho que ninguém irá questionar ser o mais alto, mas isso faz com que os outros galhos daquela árvore sejam mais fracos? Menores? Mais velhos? Mais quebradiços? Não... O galho mais alto é apenas mais alto. Da mesma forma que o argumento mais sólido é apenas mais sólido, de modo que tudo o mais na dinâmica do debate nada mais é que uma série de manobras com o objetivo não de se chegar a uma conclusão, mas sim de enaltecer o argumento utilizado, mesmo que ele diga pouco ou mesmo nada quanto ao contexto do que está sendo debatido.

Retomando o exemplo das entidades desencarnadas, dizer que havia espíritas charlatões significa que o interlocutor estava realmente dizendo que isso não fosse um fato? Dizer que pessoas passem por experiências espirituais em casos de "quase morte" significa que se esteja afirmando que tais fenômenos não possam ser reproduzidos com estímulos cerebrais? Mais uma vez as respostas são negativas.

O que geralmente se observa nessa conduta própria dos "grandes debatedores" é apenas e tão somente escolherem aquilo que é óbvio. E esse é um grande desafio para aqueles que ousam tentar transcender o óbvio, pois o óbvio já é conhecido, já é sabido, já está comprovado, então se quisermos transcendê-lo devemos lançar novas propostas, que ainda não foram testadas, que ainda não foram comprovadas, tratar sobre o que ainda não é sabido, nem conhecido e muitas vezes nem aceito.

O fato de se tratar de algo que não seja óbvio não significa como querem fazer parecer os Paladinos que se esteja cometendo a estultice de negar o óbvio, de contradizer o óbvio, pois se há algo que é indubitavelmente óbvio é que negá-lo é algo sem sentido que muito provavelmente o interlocutor mais ousado não estará fazendo.

O modus operandi de um Paladino do Óbvio é o de defender aquele conceito já bem conhecido, aceito por todos e bem estabelecido, como se este estivesse sendo atacado apenas pela apresentação de algo que trate de assuntos que o conceito defendido não abarque. Como por exemplo se o assunto for violência, a postura do Paladino será a de se mostrar veementemente contrário à violência, indignado com a violência, pois essa é a posição mais óbvia e é sabido, universal e aceito por todos que a violência é algo a ser repudiado, mas isso não detém o Paladino, que estará levantando a bandeira da Não-Violência como se existisse alguém que estivesse fazendo uma campanha a favor.

Tudo que já se sabe sobre a Violência está bem estabelecido, bem como a postura de todos com relação a ela, mas porque ela ainda existe? Será que ela não seria algo natural no ser humano? Mas se eu faço esse questionamento para um Paladino do Óbvio ele automaticamente já irá me cobrir de provas de que a Violência é algo reprovável, vai se indignar que eu considere a violência uma coisa boa... Opa opa opa... Pera aí... Ao dizer que é algo natural eu estava dizendo que era algo bom?


Estou certo de que com esses exemplos o caro leitor já deve ter se lembrado de vários indivíduos que se encaixem no perfil descrito até aqui, podendo inclusive o próprio caro leitor constatar já ter feito uso, assim como eu, deste subterfúgio.

Como disse não se trata exatamente de uma crítica, mas o que podemos observar é que tal postura poderia ser classificada como anti-esportiva em um debate, limitando os temas àquilo que já estamos todos cansados de saber e de discutir, refreando assim qualquer iniciativa de se ousar em pensar além do óbvio.

Entendamos que este texto consiste apenas numa análise de comportamento e uma forma de ilustrar o tema central que consiste numa observação sobre as forças que nos movem, que movem nossa mente e até mesmo nossas emoções e ações. Forças invisíveis que se encontram em cantos obscuros de nossa psique, nos trazendo inicialmente um impulso instintivo básico que somente depois ao se manifestar é que vem a se tornar mais elaborado e complexo assumindo uma grande variedade de formas e maneiras de se mostrar.

Nossas personalidades que seriam o conjunto do que manifestamos em nossas ações, pensamentos, reações e emoções é composta pelo o que se chama de quaternário inferior, sendo ela composta pelos quatro corpos mais densos de nossa anatomia oculta, sendo eles o físico denso, o físico etérico, o astral e o mental concreto.

Da mesma forma que expressamos nossa personalidade na realidade material do plano físico denso, igualmente a nossa individualidade a partir do mental concreto se manifesta em nossa personalidade definindo o nosso senso de particularidade promovendo os impulsos iniciais para a auto-manifestação.

Nesse processo se dá que a nível emocional e no campo dos pensamentos, domínio esse pertinente ao plano astral, nos vemos em eterna busca do equilíbrio entre duas tendências opostas, sendo essas representadas por dois aspectos básicos do tatwa Apas, bem como pela interação entre os Sephiroth Hod e Netzach.

Sendo que um nos impulsiona à aglutinação, à comunhão e confraternização para com os iguais, e da mesma forma nos impulsionando a assumirmos identidade e identificação com esses iguais, nos abstendo de tudo que venha a nos distinguir do grupo ao qual buscamos nos integrar.

O outro impulso nos leva a distinção, à separatividade, a buscar reforçar a particularidade, nos distinguindo dos que nos são semelhantes, enfatizando o sentimento de especialidade, nos levando a buscar ser exclusivos, diferentes, especiais e de preferência superiores. Embora nem sempre esta última questão seja uma constante, pois muitas vezes este impulso se manifestará na tendência de nos sentirmos satisfeitos em sermos distintos por exclusão, como o mais perseguido, o menos afortunado, mais humilde etc.

Tais impulsos nos levam em última análise a optar entre a qual estaremos cedendo a cada ocasião. Existem aqueles que optam por um mais constantemente que por outro e essa dualidade é base essencial dos conflitos humanos, em que estaremos sempre assumindo uma postura ou outra com relação ao outro.

Aquilo que no campo das idéias poderia ser compreendido apenas como uma preferência pessoal, um traço de personalidade, no campo das emoções e dos impulsos instintivos é que se mostra uma realidade mais profunda e marcante, de modo que sentimos uma atração intensa ora por um ora por outro dos impulsos sendo essa uma escolha entre o que lhe dá a sensação de prazer, de estar do lado "certo", ou aquilo que lhe dá a sensação de poder, de não estar com aqueles que se acham "certinhos".

Deste ponto em diante esse já se torna um outro assunto que pretendo abordar em textos futuros. Por hora espero que o exposto tenha levado a que ao menos não venhamos a julgar tão rapidamente quem não fala o que é óbvio, pois muito raramente ele estará questionando o que é óbvio mas sim buscando apenas superá-lo.