sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

O Caminho da Mão Esquerda


O conceito de Esquerda surgiu a partir da contestação de métodos e regras pré-estabelecidas e sedimentadas de como a busca espiritual deveria ser vivenciada, de modo que este modelo vigente passou a ser chamado de Direita e tudo que viesse a questioná-lo e subvertê-lo seria visto como um princípio "renovador", "reformador", oferecendo assim uma alternativa para aqueles que não se adequavam ou não aceitavam se adequar às tradições institucionalizadas.

Para melhor compreender a Esquerda podemos nos valer de uma definição que serve de contra-ponto ao Dogmatismo da Direita, podendo se dizer que além de questionadora, revolucionária e contestadora, a Esquerda será em essência principalmente "Pragmática".

O Pragmatismo, neste caso se define como uma referência norteadora que deveria servir como um princípio capaz de manter o indivíduo focado em sua objetividade e suas prioridades. Na prática acaba se manifestando muito mais como um reconhecimento crítico da ineficácia e falta de propósito no cumprimento de regras Dogmáticas praticadas pela Direita. Ou seja, ao invés de se fazer o que esteja determinado como sendo o correto, se estará fazendo aquilo que se julgar mais prático e objetivo.

Esta visão questionadora do Dogmatismo se estende ao conceito de "Lei Divina", embora nem sempre esta venha a ser contestada pela Esquerda ainda assim se estará fazendo releituras e como hábeis advogados estarão reinterpretando as "Leis" desconsiderando os acordos e convenções dos Dogmas.

Aqui neste caso as representações das mãos do "Bode de Mendes" demonstram o foco ideal deste Caminho como fundamentalmente libertário, sendo assim simbolizada essa liberdade pelo simbolismo da Sephira Chesed, que denota o conceito de "Direitos Naturais" do Indivíduo, este como merecedor de toda Benevolência e concessões atribuídas pela própria Natureza.

O conceito de Mérito é bastante presente no pensamento da Esquerda, em que tais dádivas são merecidas por terem sido alcançadas por esforço pessoal, de modo que a idéia de liberdade é vista como resultado de uma conquista do indivíduo que se liberta das regras Dogmáticas da Direita que acabam permeando a própria visão que a sociedade terá dos valores que a norteiam.

Na Esquerda o "vício" que se observa conforme mencionei no texto "Os Dois Caminhos" seria a "busca pelo Poder". Neste caso o enfoque se observa na simbologia da Sephira Netzach, em que se vê a questão da superação, a "Vitória sobre a morte" de modo que o impulso inconsciente que se manifesta aqui é o da individualidade, do ser que se distingue e se destaca do seu meio, a tendência de buscar ser exclusivo e diferente dos demais. Assim é comum neste Caminho temas relativos ao quanto o Caminho é Solitário, bem como são enaltecidos os triunfos pessoais, realizações, além de avaliações e comparações entre níveis de desenvolvimento, ou conceitos de superioridade.

No que se refere ao Caminho da Mão Esquerda a passagem do Gênesis que citei no texto da Direita, em que "as águas foram colocadas em um só lugar criando-se assim o elemento árido", esta figura árida, como costuma ser colocada nos simbolismos do "Deserto" enfatizam o individualismo, o isolamento, a solidão, além das provas e desafios a serem superados por aquele que trilha este Caminho, proporcionando com isso um sentimento de orgulho e satisfação com sua própria capacidade de superar obstáculos e de se colocar acima dos demais.

Este "vício" pelo Poder acaba se refletindo em certos aspectos do comportamento, como a ênfase no individualismo as vezes acaba por enfatizar o egoísmo, orgulho e tendências a discriminação, por se considerarem uma classe de seres superiores aos demais. É muito comum que adotem simbolismos relativos a guerras, batalhas, guerreiros, atribuindo uma visão competitiva ao desenvolvimento espiritual. Desde modo os preceitos da Sephira Chesed não são plenamente vivenciados, pois a liberdade da qual se julgam merecedores não consideram que seja algo a ser concedido àqueles que não "fizeram por merecer". Dando ênfase aos aspectos de luta e superação simbolizados por Geburah.

O conceito de Justiça acaba sendo distorcido pelo excesso de rigor, tornando a Esquerda muitas vezes menos libertária do que seria seu ideal. Muitas vezes na busca pela contestação aos valores da Direita a Esquerda acaba perdendo o Pragmatismo na criação de novos Dogmas contrários aos da Direita e essa postura leva até mesmo a questionar o próprio conceito de Divindade, pois aqueles que não se destacam de seu meio, aqueles que não superam seus iguais, são vistos como indignos do Poder e portanto vistos como "fracos" e assim extrapolam e generalizam os conceitos de modo a considerar que uma Divindade que conceda suas benesses a quem não tenha feito esforços para conquistá-las será então uma Divindade "fraca".

Com a criação desses conceitos de mera "oposição" à Direita a Esquerda perde a objetividade e acaba abrindo mão do Pragmatismo, desviando o foco daquilo que deveria ser a meta para todo aquele que buscasse combater um conceito que é a busca pela Verdade. Que na prática acaba sendo substituída pelo impulso de repelir conceitos cristalizados.

A nível supra-físico é possível se observar que diferentemente da Direita a Esquerda não costuma formar grupos de iguais. Não há o interesse em conforto, muitas vezes vemos entidades da Esquerda estabelecidas em "Castelos", "Fortalezas", "Quartéis", "Acampamentos", sempre assumindo uma postura defensiva, como se temessem se acomodar, como se com isso pudessem ser suplantados por oponentes.

Mesmo havendo influência do Caminho Iniciático na Esquerda, tanto no Oriente quanto no Ocidente veremos que o Pragmatismo leva a que se busque primeiramente a prática, muitas vezes desconsiderando-se completamente a teoria. A questão é que sem o embasamento teórico a prática muitas vezes deixa de se tornar tão eficaz quando almejariam aqueles que seguem por este Caminho. Acabam buscando principalmente por "receitas prontas" de como mover as forças da Natureza de acordo com sua "Vontade", que na maioria dos casos não se trata de Força de Vontade propriamente dita, mas sim a satisfação de caprichos e gostos pessoais. Há a ênfase no uso de ritualísticas mas não na prática do Sacerdócio.


Existe um enorme interesse por parte da Esquerda por Magia, sobre tudo nutrem grande simpatia pelos preceitos da Magia Negra, que por propor a manifestação no sentido do espírito para a matéria leva a falsa impressão de se tratar de algo mais "forte". No entanto, o enfoque individualista leva a que se negligencie requisitos fundamentais para a prática da Magia de modo geral e muitas vezes acabam se restringindo à prática do que alguns chamam de Magia Amarela, por negligenciarem valores como a Autoridade do Mago e o reconhecimento desta pelos seus pares para o exercício da Magia Negra propriamente dita. Na busca por triunfos e vitórias pessoais e por ter o enfoque apenas no indivíduo e na liberdade de seu isolamento acaba limitando o alcance de sua influência sobre aqueles que estejam ao redor.

Esse conceito da Magia Negra como algo que traz do espiritual para o material é visto com bastante interesse pela Esquerda, de modo que ocorre a tendência de buscarem por uma densificação, tornando-se menos sutis, menos espirituais, para assim vivenciarem melhor os Poderes da Natureza.

Existe a busca pelo reconhecimento, por alcançar um nível de superação e triunfo incontestável, de conquistar tamanho Poder que não haveria como ser negada sua superioridade. Mas aí surge um dilema, pois como poderia ser reconhecido senão por seus iguais e se toda a trajetória for pautada na repulsa por iguais jamais se alcançará esse nível de reconhecimento tão desejado.

Como resultado vemos uma tendência a ocultar seus prodígios, feitos e triunfos, como que negando querer reconhecimento e evitando igualmente a comparação com seus iguais, por não considerá-los como tal e por ver a todos como concorrentes, de modo que acabam se contentando apenas com a satisfação pessoal de quebrar seus próprios paradigmas sem se expor à opinião pública.

Mesmo que a princípio pareça haver muita hostilidade por parte da Esquerda, isto acaba por ocultar tendências protecionistas que frequentemente vêm a se manifestar, a partir do momento que o indivíduo se coloca acima dos que lhe rodeiam esta superioridade leva à se desenvolver um protecionismo um tanto vaidoso, por considerar que os que lhe rodeiam não são tão capazes quanto eles próprios de modo que dependeriam de sua "proteção". Não são considerados iguais, mas sim diferentes e justamente estariam sendo protegidos daqueles que lhe fossem iguais, pois na sua visão competitiva alguém que tivesse o mesmo potencial seria uma ameaça direta.

Isso gera um comportamento análogo ao da Direita em converter, que no caso da Esquerda poderia se considerar uma tendência a submeter, atrair para junto de si, para de baixo de suas "asas protetoras" aqueles que lhe sejam diferentes, que no caso são vistos como menos afortunados em seus triunfos, mas que estariam sob sua proteção, quando não a seu serviço, tornando-o com isso comparativamente superior e fazendo-o sentir ainda mais "poderoso".

A tendência ao desenvolvimento de Orgulho e Vaidade é presente tanto na Esquerda quanto na Direita e assim também em ambos haverão aqueles que conseguirão superar essas limitações, mas como já havia dito anteriormente o mérito será do indivíduo e não das tendências e impulsos aos quais esteja sujeito.


Em contra partida aos simbolismos da Direita, enquanto essa se associa à Luz a Esquerda é normalmente ligada aos simbolismos da Escuridão, que tradicionalmente teria significados relativos à Sabedoria e aos Mistérios, embora na prática o que costumo ocorrer seja a tendência da Esquerda em se opor aos preceitos da Direita, veríamos então conotações pelas quais se veria a Divindade dentro dos conceitos da Direita como uma manifestação "destituída de Poder" de modo que se buscaria por uma outra forma de Divindade oposta, oculta na Escuridão detentora de "Grande Poder". Ou seja, acabariam incorrendo nas mesmas distorções que a Direita com os conceitos de Luz, pois acabam por se contentar em sentirem-se poderosos por ter contato com uma fonte de Poder. Seria semelhante a quem se sinta forte por estar sob uma cachoeira e por sentir a força da água a lhe golpear, sem se dar conta de que essa força não é sua.

No caso da Esquerda é menos comum que se encontre grandes instituições, sendo que muitas vezes encontraremos ramos mais radicais, ou reformadores dentro das instituições da Direita, em outros casos veremos movimentos isolados, pois em muitos casos a partir do momento em que a instituição assume uma posição de destaque e reconhecimento na sociedade, esta acaba assumindo um direcionamento e uma estrutura que melhor seria definida como sendo de Direita.

Ainda assim veremos movimentos e instituições de Esquerda ligadas ao Satanismo, Caoismo, ordens mais extremistas da Igreja Católica como seria o caso da Opus Dei, seitas isoladas dedicadas à práticas de feitiçaria, alguns ramos do paganismo, xamanismo e asatru; alguns Terreiros dentro da Umbanda, do Candomblé, Quimbanda, Hudu entre outros; Escolas Esotéricas dedicadas à práticas de mentalismo; Ramos isolados de Yoga, ou tais como a Bon Po Tibetana; Alguns ramos rosa-cruz como a AMORC, ou mesmo ramificações como Thelema etc.

Por mais que possam haver instituições e movimentos alinhados com a conduta da Esquerda o mais comum é que se encontre indivíduos isolados com essa conduta muitas vezes não vindo a se organizar em grupos. Ou ainda encontrar movimentos de contra cultura, como o caso dos "Teóricos da Conspiração" por assumirem uma postura de contestação às instituições estabelecidas.

Aqui mais uma vez ressalto que o que foi classificado como "vícios" da Direita não implica em uma crítica à indivíduos ou instituições, mas sim apenas uma forma de analisar as tendências e impulsos inconscientes que nos levam a tal ou qual conduta.

domingo, 22 de dezembro de 2013

O Caminho da Mão Direita


A partir do momento em que se pôde observar a existência de formas distintas de busca espiritual, no qual se via uma estruturada, formalizada e estabelecida em uma sociedade e época e outra forma menos usual, por vezes contestadora e subversiva, se passou a definir a forma mais tradicional e universalmente aceita como sendo a "correta" e a outra como sendo "estranha". Sendo assim a Direita passou a existir por sua relatividade com a Esquerda.
 
Certas características ficaram mais claras ao se definir com termos mais específicos cada Caminho, de modo que o Caminho da Mão Direita passou a ser visto como conservador, reacionário por ser acima de tudo essencialmente "Dogmático".
 
O termo Dogma, mesmo que de origem anterior, teve seu significado mais definido pelo uso feito deste termo por parte da Igreja Católica Apostólica Romana. Em que definiu como sendo assuntos inquestionáveis aqueles que por convenção, votação e eleição da maioria se tivesse chegado a um consenso. Ou seja, a partir do momento em que a maioria decidiu a cerca de determinado tema este não mais seria debatido e passaria a constituir um Dogma.
 
Assim temos que mesmo que não sob a influência da Igreja Católica, o Caminho da Mão Direita buscará como meta e ideal um conceito inatacável, inquestionável de "Lei Divina", conceitos dogmáticos, rígidos daquilo que é considerado correto, bem como do que não seja aceitável.
 
Nesse sentido o simbolismo das mãos do "Bode de Mendes" como representando os ideais a serem buscados por cada Caminho se mostra bastante acertado no que se refere a essa postura encontrada nesse Caminho, em que se busca trilhar sob conceitos de Justiça e Lei, simbolizados pela Sephira Geburah.
 
É natural ao ser humano se considerar como estando do lado correto, do lado vencedor, do lado "do bem", mas no Caminho do Mão Direita isto se mostra especialmente importante, pois por influência e associação ao Caminho Místico uma das metas ideais passa a ser a busca pela "Pureza".
 
Ao tratar da questão do que representaria um "vício" para o Caminho da Mão Direita eu vim a me referir no texto "Os Dois Caminhos" à "busca pelo Prazer". É preciso ser cuidadoso ao interpretar esta expressão pois este é um conceito bastante relativo que exige que se defina a que tipo de prazer a Direita busca.
No caso essa busca se mostra impelida pela tendência natural simbolizada pela Sephira Hod de buscarmos nos unir aos que nos são iguais e este é o prazer almejado, pois o que geralmente se vê enfatizado e como ponto comum neste Caminho são conceitos de "Família Espiritual", "Fraternidade", "Irmandade", "Lar", "Casa", "Morada" etc.
 
Todos estes valores análogos aos conceitos de "União", "Comunhão", sendo estes valores observados simbolicamente pela água, em que vemos no Gênesis a passagem que menciona que após ter sido criada a água, esta ter sido dividida entre "águas de cima" e "águas de baixo", as de baixo foram "colocadas todas em um só lugar criando-se assim o elemento árido". Assim vemos essa união das águas, tal como se vê na Natureza todas as águas convergindo para o Mar, assim representando o Caminho da Mão Direita, no qual são cultivados valores relativos a essa união, fusão e dissolução dos indivíduos em uma coletividade.
 

Deste modo também acaba por se manifestar um novo desdobramento do vício da Direita pelo prazer, que é a comodidade, o conforto, o amparo e apoio da coletividade que acaba por enfraquecer a individualidade e inebriar a Vontade, levando a que os valores representados pela Sephira Geburah não sejam vividos com plenitude, pois não há uma busca pela superação, não há o impulso para a conquista, mas sim apenas uma disposição a receber "Dádivas Divinas", se postando como beneficiários da Benevolência simbolizada pela Sephira Chesed.

Como disse quando me referi aos Dois Caminhos, as qualidades são mais mérito do indivíduo em sua busca do que do Caminho no qual se encontra. Ou seja, mesmo que este impulso natural que leva o indivíduo a ter uma orientação mais voltada ao Caminho da Mão Direita acabe o levando a se acomodar, ainda assim caberá a ele superar essa tendência para alcançar o ideal almejado.

A busca por colocar-se estrita e dogmaticamente sob os rigores da "Lei Divina" leva a que a Direita busque sempre pela Ordem e frequentemente assumem posturas de autoridade perante aqueles que não estejam plenamente inseridos dentro do conjunto de regras criadas por cada grupo. Esse conjunto de regras vem por criar e fortalecer a identificação entre os participantes atribuindo assim uma identidade ao grupo.
 
Tal processo é muito mais perceptível a níveis supra-físicos nos quais a sociedade não se encontre tão estruturada como a que temos hoje a nível físico. Assim é comum que se encontre as entidades da Direita estabelecidas em "Cidades", "Cidadelas" ou "Colônias" a níveis supra-físicos nas quais permanecem unidos entre si mas isolados dos que lhes sejam diferentes, formando "ilhas" de Ordem na qual usufruam de alguns dos prazeres da civilização.

Embora haja grande influência do Caminho Místico na Direita, ainda assim se vê diferenças entre o que encontramos nas culturas Ocidental e Oriental. Sendo que podemos observar que a Direita no Oriente naturalmente dará ênfase ao desenvolvimento prático em detrimento do teórico. E isso também é observado no Ocidente. Mas isso essencialmente no que se refere ao Caminho Místico, pois naquilo que concerne ao Caminho Iniciático, especialmente no Ocidente o que se vai observar é que a Direita irá dar ênfase ao desenvolvimento teórico, muitas vezes até mesmo evitando a prática, ou a reduzindo a atividades ritualísticas.

Existem grandes ressalvas por parte da Direita de modo geral quanto à Prática especialmente de Magia, de modo que só costuma ser considerada aceitável a Magia Branca. Mas isso em termos ideológicos, pois neste caso a condição de Mago, como naturalmente alguém distinto dos demais, entraria em conflito com os preceitos da Direita mais voltados à comunhão de iguais.

As práticas ritualísticas e sacerdotais encontradas em certos ramos da Direita levam a que se acabe por exercer a prática do que alguns classificam como Magia Cinzenta, por ser uma prática que não possua todos os requisitos que seriam necessários para a Magia Branca.


As práticas tanto ritualísticas quanto vivenciais, quer sejam de Escolas Iniciáticas ou Místicas, ou mesmo de Instituições Religiosas no Caminho da Mão Direita estarão tendo como objetivo proporcionar bem-estar. Existem os conceitos de caridade e altruísmo como ideais universais, embora na prática costumem ficar restritos às suas próprias comunidades e grupos.

Os preceitos da Magia Branca de levar do material para o espiritual, são vistos com simpatia pela Direita, por colocarem seus ideais intimamente ligados à figura da Divindade, como a fonte Benevolente da qual usufruem. Deste modo há uma tendência a que suas práticas muitas vezes acabem sendo mais voltadas a alcançar um certo nível de sutilização, tornando-se menos densos, menos materiais, para assim usufruir melhor das Benesses Divinas.

Existe a busca por realidades Paradisíacas nas quais se possa estar em comunhão com a Divindade e com todos que lhes sejam iguais, usufruindo assim de prazeres celestiais sem fim. Mas para isso se faz necessário driblar a auto-crítica, pois inevitavelmente acabariam se vendo como egoístas e esta costuma ser uma qualidade considerada condenável, pois vai contra o conceito de igualdade afetando assim a união dos iguais.

Com isso se observa o comportamento de desprendimento quanto aos próprios ideais e metas, em que se vê muitos assumindo posturas altruístas de quem abre mão de realidades paradisíacas em prol de seu semelhante, sem se aperceber com isto o quanto esta atitude o coloca numa posição de superioridade levando a grandes demonstrações de vaidade.

Embora possa se reconhecer certas tendências ao comodismo por parte da Direita, isto dá a falsa idéia de passividade, quando na verdade a imagem altruísta e benevolente oculta uma forma sutil mas não menos contundente de violência. Pois ao mesmo tempo que buscam avidamente a comunhão dos iguais, também ocorre a repulsa pelos diferentes, havendo assim até mesmo conflitos históricos e a ocorrência de guerras motivadas por grupos religiosos ainda que ambos tenham uma orientação mais voltada à Direita.

A intolerância para com os diferentes leva a duas posturas, sendo uma a repulsa e o isolamento puro e simples, enquanto a outra seria a busca pela conversão, a conquista de mais um igual, desconsiderando a individualidade na tentativa de torná-lo igual para assim ser aceito.

É importante que se diga que em um sistema de classificação tão abrangente como este encontremos indivíduos nos mais diversos níveis de desenvolvimento espiritual tanto na Direita quanto na Esquerda. Desde aqueles que se deixam conduzir por esse impulso natural quanto aqueles que reconhecem sua existência e o superam.

É frequente a associação da Direita com o Simbolismo da Luz, tendo-se essa como expressão da Divindade, de modo que estes por "cumprirem" as "Leis Divinas" se fazem "merecedores" de Suas Dádivas, sendo assim "Iluminados". Sem se darem conta de que estão se contentando em receber a Luz sem serem capazes de a produzirem. Ou ainda como pessoas que se contentam em olhar o belo dia pela janela, sem se aventurarem a sair pela porta por temerem passar pelo corredor escuro até ela.

 
São considerados como de Direita as instituições religiosas maiores e mais bem estabelecidas como a própria Igreja Católica Romana, Copta, Ortodoxa, Igrejas Protestantes, Pentecostais entre outras; Centros Espíritas Kardecistas, alguns Umbandistas e alguns outros cultos de origem Africana mais tradicionalistas; os ramos mais "populares" de Islamismo, Judaísmo, Hinduismo, Xintoísmo e Budismo e diversas outras instituições religiosas mais tradicionais e socialmente aceitas em cada cultura. Igualmente encontraremos certas instituições de estudos ocultistas como por exemplo a Sociedade Teosófica, alguns ramos de Rosacrucianismo, Maçonaria etc. Além de filosofias e tendências sociais tais como o "Movimento New Age".
 
Curiosamente não apenas instituições religiosas ou espiritualistas se encaixam nesse contexto como também certas linhas de pensamento, ou mais especificamente certas condutas na defesa de idealismo como no caso do Ateísmo em que as a figura da Divindade é substituída pelo gênio humano.
 
É importante enfatizar que a despeito do teor crítico do texto, a ênfase no que classifiquei de "vícios" da Direita não representa uma crítica às instituições em si, nem mesmo a seus membros, pois em todas encontramos sempre aqueles que superam essas limitações naturais criadas por nossos impulsos inconscientes.
 

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

Os Dois Caminhos



 
"Os Dois Caminhos" é um outro título para o Arcano VI do Tarot, que por muitos é conhecido como "Os Enamorados", no entanto não é dos significados desta carta que se trata este texto, apenas os termos aqui coincidem com uma condição na qual naturalmente o ser humano se encontra, ou seja, como geralmente é interpretada essa carta, nós nos encontraríamos em uma encruzilhada na qual teríamos de decidir por qual dos dois Caminhos trilhar.
Trata-se de um tema vasto que já foi abordado parcialmente em outros textos e que no decorrer deste veremos que na verdade não vivemos realmente tal dilema da escolha, pois já somos instintivamente impelidos a um ou a outro caminho.
Conforme vimos no final do texto "Paladinos do Óbvio", podemos considerar que estas forças que impulsionam nossas atitudes e posturas perante a vida e a sociedade afetam até mesmo a nossa busca espiritual, nossa busca por "Evolução Espiritual". E estes dois impulsos básicos e opostos são tão marcantes na constituição de nossa personalidade que levaram a que se estabelecessem dois padrões distintos, duas formas de se buscar o desenvolvimento espiritual.
Estes dois modos de trilhar e experienciar nossa jornada espiritual vieram a constituir aquilo que passou a ser entendido como dois "Caminhos" possíveis para o aperfeiçoamento do Ser. Sendo que de modo geral, estes se constituirão em processo pelo qual se passou a classificar as diversas e diferentes escolas e filosofias tanto a nível religioso quanto às práticas e sistemas de estudo dentro das próprias Ciências Ocultas.
A estas duas categorias viemos a chamar de Caminho da Mão Direita e Caminho da Mão Esquerda. As origens atribuídas a estas nomenclaturas variam conforme a Escola ou Filosofia que as empregam, bem como os significados estarão variando significativamente de acordo com a categoria à qual cada um se coloca.
Há tradições que consideram que esta nomenclatura e classificação teria origem no Estudo do Tantra na Índia no qual se aplicariam estas duas definições para distinguir práticas de duas tradições distintas que abordam de maneiras diferentes a prática e estudo da filosofia Tantra.
Outra definição teria surgido a partir do Catolicismo que como política de domínio e supremacia sobre demais crenças teria se valido da passagem bíblica na qual se diz que à Direita estaria o Bem e à Esquerda estaria o Mal e mesmo que esta não fosse a origem de tal classificação acabou por enfatizar uma má interpretação do que caracterizariam estes dois Caminhos.
Ainda se poderia considerar que as terminologias teriam surgido a partir do desenvolvimento na Idade Média daquilo que mais tarde viria a ser conhecido como Satanismo, que consistia em determinados conjuntos de práticas que buscavam subverter e evocar valores contrários aos padrões predominantes vigentes na época daquilo que seria mais tradicionalmente utilizado e praticado em termos de busca por desenvolvimento espiritual.

Nesse sentido o termo "Sinistro" que significa esquerda e ao mesmo tempo traz um significado de contrário, ou aquilo que não é "direito" com a conotação de não ser "correto", ou ainda aquilo que fosse "estranho ou diferente", teria surgido por uma busca em quebrar paradigmas e trazer novas formas de praticar as ciências ocultas que não aquelas praticadas sob a influência da Igreja Católica, de modo que para isso muitas vezes se valiam de escolas e filosofias mais antigas, anteriores a esse domínio histórico.

Nem por isso essa classificação de Direita e Esquerda estaria relacionada a uma relação com o Cristianismo, pois a Direita não está restrita ao Cristianismo e nem mesmo o contrário, assim como a Esquerda não se caracteriza por uma oposição ao Cristianismo, pois essa oposição não se restringe à Esquerda e nem mesmo a Esquerda se restringe a isto.

Essas origens e referências dos termos dão compreensões frequentemente equivocadas dos significados e definições do que seria praticado e vivenciado em cada uma dessas vertentes, tanto no que se refere às definições do que viria a ser a Via Sinistra, ou Caminho da Mão Esquerda, como também do próprio Caminho da Mão Direita.

Atualmente diversas escolas se definem a partir desta classificação, bem como indivíduos igualmente se identificam e orientam sua busca espiritual tomando por parâmetro justamente essas definições, sendo comum que se veja referências, sobretudo ao Caminho da Mão Esquerda, geralmente referido por sua sigla em Inglês, Left Hand Path, ou simplesmente LHP.

Essa classificação também foi popularizada em meio aos Cultos de Matriz Africana, no qual se encontram templos, Terreiros, dedicados ou para o trabalho com a "Direita", com o trabalho com a "Esquerda", ou aquilo que alguns chamam de "Casas Cruzadas", como sendo Terreiros onde se trabalharia com entidades ligadas aos dois "lados".

A classificação nesse caso é ainda mais abrangente, pois os termos não se restringem a serem aplicados para definir apenas direcionamentos filosóficos, mas também distintas classes de seres espirituais, embora tão abrangente quanto o uso dos próprios termos é também a distorção de significados que tornam tal forma de classificar tão ambígua.

Assim, para termos uma definição mais objetiva destes dois "Caminhos" será preciso compreender que aquilo que de fato existe é uma dualidade quanto a tendências e impulsos naturais aos quais estamos todos sujeitos em nossa Condição Humana, que nos direciona naturalmente à manifestar nossa busca a partir de propostas e propósitos distintos, que mesmo havendo o elemento da escolha consciente ainda assim esses impulsos que nos levaram a fazer tais escolhas são inconscientes, instintivos e involuntários.

É importante que se diga, que a pesar de que se tenha correlações entre as classificações por lados e a classificação que distingue o "Caminho Iniciático" do "Caminho Místico", estas classificações se sobrepõem. Podendo haver tanto um direcionamento Iniciático quanto Místico em ambos os Caminhos, Esquerda e Direita. Havendo apenas uma certa tendência ao predomínio pois também essas definições serviram de origem para a criação destes termos. Ou seja, tanto o Caminho da Mão Esquerda teve origem no Caminho Iniciático quanto o Caminho da Mão Direita teve origem no Caminho Místico.


Iniciático ou Místico seriam os modos pelos quais se buscaria transcender nossa condição atual de desenvolvimento espiritual, que poderá se caracterizar tanto por uma conduta própria da Mão Direita, quanto da Mão Esquerda, sendo esses os pontos de partida para o avanço espiritual.

Igualmente equivocada é a definição do Caminho da Mão Direita como sendo o "caminho do bem" e da Mão Esquerda como sendo o "caminho do mal", este equívoco ocorre justamente por uma das origens do uso do termo "Esquerda" ter sido associado ao Satanismo, sendo esta uma doutrina baseada no conceito de Satã, significando "O Opositor", de modo que o senso comum é levado a assim definir.

Sei que muitos antes de mim buscaram traçar maneiras de explicar, categorizar e definir as fronteiras que distinguem os dois Caminhos e geralmente o que vemos é uma visão "Esquerdista" do que eles são e uma visão "Direitista" do que eles são, enquanto busco aqui dar uma visão mais "neutra" por assim dizer.

Pois juntamente com essa dualidade surgiu ainda o conceito de "Caminho do Meio", cujas definições quando encontradas se tornam ainda mais difusas e subjetivas do que aquelas atribuídas aos dois Caminhos.

Mas ainda assim me sinto confortável em dar um parecer neutro justamente por eu ter um direcionamento pessoal mais voltado ao conceito de "Caminho do Meio", de modo que isto me dá certa liberdade em atribuir definições que ajudem a compreender ambos os Caminhos, tanto da Direita quanto da Esquerda.

Neste ponto minha abordagem tomará como parâmetro de definição não as "virtudes" dos dois Caminhos, porque estas são muito mais mérito do buscador do que do Caminho em si, sendo que trago aqui um olhar mais crítico aos "vícios" de cada Caminho, por serem estes efeito dos impulsos inconscientes que nos movem.

Mesmo porque as qualidades de cada Caminho já são por demais debatidas e em muitos casos tornam o entendimento ainda mais distorcido, no qual as qualidades de um Caminho passam a ser vistas como defeitos pelo outro e assim estereótipos são mantidos e a discussão descamba para visões tão partidaristas quanto as que vemos nos conceitos de Direita e Esquerda no meio Político.

Que aliás, é outra questão que precisa ser esclarecida, pois até mesmo tal distorção é encontrada em certos meios nos quais se confundem a classificação de Caminhos Espirituais e de orientação Política, sendo que de modo algum haveria qualquer correlação, mesmo que alguns meios busquem forçá-la como método de manipulação da opinião pública.

O que mencionei como sendo os "vícios" que distinguiriam os dois Caminhos são basicamente os impulsos inconscientes que havia mencionado no texto "Paladinos do Óbvio", sendo eles o impulso que nos leva a buscar pelo "Poder" e o que nos leva a buscar pelo "Prazer". É preciso que essa análise seja feita com grande atenção, pois a relação é bastante sutil e o uso dos termos é bastante restrito, de modo que veremos em ambos os lados qualidades tais como Orgulho, Vaidade, Ambição e Sentimentos de Superioridade por exemplo.


Algo que se há de ressaltar é que ambos os Caminhos consistem em definições do estado, ou padrão no qual se encontram nossas tendências naturais que vêm a se manifestar em nossa busca espiritual. Sendo assim os Dois Caminhos se tratam de pontos de partida e não exatamente metas a serem alcançadas, mesmo que dentro de cada qual se tenha metas a alcançar, objetivos, anseios, desejos, ambições, propósitos, mas estes servirão apenas como elementos que nos levarão ao auto-conhecimento e na superação destes é que se encontra realmente o desenvolvimento espiritual propriamente dito, que virá a ser alcançado através do Caminho Iniciático ou Místico independente de nosso ponto de partida ser a Direita ou a Esquerda.

Definitivamente não é fácil estabelecer conceitos mais objetivos para os dois Caminhos quando estes tratam de questões tão abrangentes, pois o número de ressalvas que se faz necessário é considerável. Outra ressalva importante é quanto à atribuição dos dois Caminhos como especificadores de modalidades de práticas Mágicas. Esta ocorre em função de outra dualidade considerada em nosso meio que são os conceitos de Magia Branca e Magia Negra.

Essas definições de "cores" da Magia é um outro tema bastante vasto que não nos caberia abordar neste mesmo texto, mas ainda que haja frequentemente o interesse pela prática da Magia Negra no Caminho da Mão Esquerda e da Magia Branca no Caminho da Mão Direita, essas definições Mágicas não se restringem aos dois Caminhos e nem são exclusivas de um ou de outro. Como também não se distinguem os dois Caminhos por quaisquer tipos de prática Mágica específica, seja pela classificação que se quiser usar, tanto de Alta Magia e Baixa Magia, pois as relações serão indiretas e imprecisas.

Dito isto temos também que a distinção entre Magia Negra e Branca teriam servido originalmente para cunhar os termos Direita e Esquerda, mas estes também são conceitos equivocados. Tais distorções de significado ocorrem porque encontramos definições dadas pela Direita para o que seria a Esquerda e vice versa, de modo que frequentemente os termos e definições acabam por ter caráter pejorativo, ao se julgar o oposto como oponente. O que também é uma dualidade bastante comum à "Mente" e que se demonstra em diversos aspectos do viver humano como se observa toda vez que nos deparamos com dualidades.

Com isto estamos tratando muito mais do que não são esses Caminhos do que aquilo que eles efetivamente são, no entanto vi como absolutamente necessário retirar da questão todos esses elementos capazes de produzir interpretações equivocadas, pois algumas chegam a nos dar até mesmo concepções invertidas do que significaria cada Caminho.

Um exemplo disso é a associação frequentemente feita com as mãos da figura do "Bode de Mendes" em que se vê as inscrições "solve" na direita e "coagula" na esquerda. No entanto essas fazem alusão respectivamente aos Sephiroth Geburah e Chesed, tendo significados análogos à "Austeridade" o primeiro e "Benevolência" o segundo. Qualidades essas observadas inversamente quando vistas como virtudes do Caminho da Mão Direita e da Mão Esquerda.

Poderíamos considerar tais qualidades como "ideais" que viriam a compensar as tendências observadas em cada Caminho, sendo que a Esquerda precisaria compensar com Benevolência a sua Austeridade e contrário se aplicaria ao Caminho da Mão Direita.

O presente texto tem caráter introdutório já que pretendo abordar mais detidamente os dois Caminhos em textos separados, de modo que para bem entendê-los recomendo fortemente que se leia antes este e se possível também aqueles que foram aqui linkados, por trazerem elementos que virão a enriquecer o entendimento do tema em questão.



quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Paladinos do Óbvio


É curioso observar o quanto certas atitudes estão tão integradas ao nosso viver que nem nos damos conta de que as tomamos. Algo que é preciso que levemos em conta para ponderar sobre este tema é a questão daquilo que nos move.

Somos movidos por impulsos inconscientes, mesmo em ocasiões que julgamos estarmos verdadeiramente expressando  uma opinião pessoal. Sim a opinião nos pertence mas temos algo em nós que nos impulsiona a expressar esta opinião e igualmente nos levou inicialmente a concebê-la.

Deixemos claro que este texto não consiste em uma crítica, mas muito mais uma constatação. Mesmo porque eu mesmo já sucumbi a estes mesmos impulsos diversas vezes e fosse criticar esta conduta então esta seria uma auto-crítica.

O tema abordado aqui diz respeito a algo que observamos constantemente nos meios de comunicação em especial na Internet, quer seja por escrito em fóruns de debate, em Blogs, quer seja através dos Vlogs do Youtube, ou ainda, em discussões e debates televisionadas.

Trata-se de um recurso sutil utilizado para se prevalecer em debates, pelo qual se toma como bandeira valores e conceitos inquestionáveis, inatacáveis, contra os quais obviamente ninguém seria contrário.

Assim vemos egos se inflando como se solidez do tema abraçado realmente lhe pertencesse. Imaginemos aqui alguns exemplos, pois tal tática de debate é muito observada em nosso meio, então um indivíduo faz algum comentário sobre determinado assunto dentro de algum contexto específico como por exemplo tratar sobre entidades desencarnadas.

De pronto algum Paladino do Óbvio virá questionar ao interlocutor quanto a provas, argumentará com comprovações geralmente científicas de que houveram espíritas charlatães que forjaram aparições fantasmagóricas, lembrará que já foram feitos testes científicos pelos quais se conseguiu reproduzir o efeito da sensação de levitação e visão de um túnel luminoso como geralmente é relatado em experiências de quase morte, atribuindo tais fenômenos a um efeito eletroquímico do cérebro, já que através de estímulos elétricos se obteve resultados semelhantes.

Em geral, tais argumentações são incontestáveis, inquestionáveis e quem se vale delas se infla e assume uma postura de superioridade absoluta, que lhe dá uma sensação muito prazerosa de poder. O que este valoroso defensor da lógica, da sanidade mental e do bom senso não se apercebe é que tais informações podem ser bastante contundentes por si só, mas elas não fazem com que ele por reproduzí-las tenha qualquer uma dessas qualidades observadas na informação em si.

O que ocorre por de trás das palavras, é um jogo de poder entre personalidades, que expressa características bastante primitivas de nossa dinâmica social, sendo que tais estratégias são observadas em linguagens não verbais em primatas, como no caso de chimpanzés que demonstram sua superioridade frente ao bando se colocando no galho mais alto de uma árvore na qual o bando esteja. Estar no galho mais alto faz daquele indivíduo superior aos demais? Faz dele mais forte? Faz dele mais inteligente? Faz dele mais alto? Não, não e não.


O galho é alto e não o chimpanzé, da mesma forma que o uso de um argumento tido como forte não faz do indivíduo um melhor debatedor e nem faz com que suas idéias sejam superiores, ou mais inteligentes, ou mais criativas ou melhor elaboradas que as do interlocutor.

Geralmente esse galho escolhido será um galho que ninguém irá questionar ser o mais alto, mas isso faz com que os outros galhos daquela árvore sejam mais fracos? Menores? Mais velhos? Mais quebradiços? Não... O galho mais alto é apenas mais alto. Da mesma forma que o argumento mais sólido é apenas mais sólido, de modo que tudo o mais na dinâmica do debate nada mais é que uma série de manobras com o objetivo não de se chegar a uma conclusão, mas sim de enaltecer o argumento utilizado, mesmo que ele diga pouco ou mesmo nada quanto ao contexto do que está sendo debatido.

Retomando o exemplo das entidades desencarnadas, dizer que havia espíritas charlatões significa que o interlocutor estava realmente dizendo que isso não fosse um fato? Dizer que pessoas passem por experiências espirituais em casos de "quase morte" significa que se esteja afirmando que tais fenômenos não possam ser reproduzidos com estímulos cerebrais? Mais uma vez as respostas são negativas.

O que geralmente se observa nessa conduta própria dos "grandes debatedores" é apenas e tão somente escolherem aquilo que é óbvio. E esse é um grande desafio para aqueles que ousam tentar transcender o óbvio, pois o óbvio já é conhecido, já é sabido, já está comprovado, então se quisermos transcendê-lo devemos lançar novas propostas, que ainda não foram testadas, que ainda não foram comprovadas, tratar sobre o que ainda não é sabido, nem conhecido e muitas vezes nem aceito.

O fato de se tratar de algo que não seja óbvio não significa como querem fazer parecer os Paladinos que se esteja cometendo a estultice de negar o óbvio, de contradizer o óbvio, pois se há algo que é indubitavelmente óbvio é que negá-lo é algo sem sentido que muito provavelmente o interlocutor mais ousado não estará fazendo.

O modus operandi de um Paladino do Óbvio é o de defender aquele conceito já bem conhecido, aceito por todos e bem estabelecido, como se este estivesse sendo atacado apenas pela apresentação de algo que trate de assuntos que o conceito defendido não abarque. Como por exemplo se o assunto for violência, a postura do Paladino será a de se mostrar veementemente contrário à violência, indignado com a violência, pois essa é a posição mais óbvia e é sabido, universal e aceito por todos que a violência é algo a ser repudiado, mas isso não detém o Paladino, que estará levantando a bandeira da Não-Violência como se existisse alguém que estivesse fazendo uma campanha a favor.

Tudo que já se sabe sobre a Violência está bem estabelecido, bem como a postura de todos com relação a ela, mas porque ela ainda existe? Será que ela não seria algo natural no ser humano? Mas se eu faço esse questionamento para um Paladino do Óbvio ele automaticamente já irá me cobrir de provas de que a Violência é algo reprovável, vai se indignar que eu considere a violência uma coisa boa... Opa opa opa... Pera aí... Ao dizer que é algo natural eu estava dizendo que era algo bom?


Estou certo de que com esses exemplos o caro leitor já deve ter se lembrado de vários indivíduos que se encaixem no perfil descrito até aqui, podendo inclusive o próprio caro leitor constatar já ter feito uso, assim como eu, deste subterfúgio.

Como disse não se trata exatamente de uma crítica, mas o que podemos observar é que tal postura poderia ser classificada como anti-esportiva em um debate, limitando os temas àquilo que já estamos todos cansados de saber e de discutir, refreando assim qualquer iniciativa de se ousar em pensar além do óbvio.

Entendamos que este texto consiste apenas numa análise de comportamento e uma forma de ilustrar o tema central que consiste numa observação sobre as forças que nos movem, que movem nossa mente e até mesmo nossas emoções e ações. Forças invisíveis que se encontram em cantos obscuros de nossa psique, nos trazendo inicialmente um impulso instintivo básico que somente depois ao se manifestar é que vem a se tornar mais elaborado e complexo assumindo uma grande variedade de formas e maneiras de se mostrar.

Nossas personalidades que seriam o conjunto do que manifestamos em nossas ações, pensamentos, reações e emoções é composta pelo o que se chama de quaternário inferior, sendo ela composta pelos quatro corpos mais densos de nossa anatomia oculta, sendo eles o físico denso, o físico etérico, o astral e o mental concreto.

Da mesma forma que expressamos nossa personalidade na realidade material do plano físico denso, igualmente a nossa individualidade a partir do mental concreto se manifesta em nossa personalidade definindo o nosso senso de particularidade promovendo os impulsos iniciais para a auto-manifestação.

Nesse processo se dá que a nível emocional e no campo dos pensamentos, domínio esse pertinente ao plano astral, nos vemos em eterna busca do equilíbrio entre duas tendências opostas, sendo essas representadas por dois aspectos básicos do tatwa Apas, bem como pela interação entre os Sephiroth Hod e Netzach.

Sendo que um nos impulsiona à aglutinação, à comunhão e confraternização para com os iguais, e da mesma forma nos impulsionando a assumirmos identidade e identificação com esses iguais, nos abstendo de tudo que venha a nos distinguir do grupo ao qual buscamos nos integrar.

O outro impulso nos leva a distinção, à separatividade, a buscar reforçar a particularidade, nos distinguindo dos que nos são semelhantes, enfatizando o sentimento de especialidade, nos levando a buscar ser exclusivos, diferentes, especiais e de preferência superiores. Embora nem sempre esta última questão seja uma constante, pois muitas vezes este impulso se manifestará na tendência de nos sentirmos satisfeitos em sermos distintos por exclusão, como o mais perseguido, o menos afortunado, mais humilde etc.

Tais impulsos nos levam em última análise a optar entre a qual estaremos cedendo a cada ocasião. Existem aqueles que optam por um mais constantemente que por outro e essa dualidade é base essencial dos conflitos humanos, em que estaremos sempre assumindo uma postura ou outra com relação ao outro.

Aquilo que no campo das idéias poderia ser compreendido apenas como uma preferência pessoal, um traço de personalidade, no campo das emoções e dos impulsos instintivos é que se mostra uma realidade mais profunda e marcante, de modo que sentimos uma atração intensa ora por um ora por outro dos impulsos sendo essa uma escolha entre o que lhe dá a sensação de prazer, de estar do lado "certo", ou aquilo que lhe dá a sensação de poder, de não estar com aqueles que se acham "certinhos".

Deste ponto em diante esse já se torna um outro assunto que pretendo abordar em textos futuros. Por hora espero que o exposto tenha levado a que ao menos não venhamos a julgar tão rapidamente quem não fala o que é óbvio, pois muito raramente ele estará questionando o que é óbvio mas sim buscando apenas superá-lo.

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Sobre testes em animais


Em vista de eventos recentes tem-se discutido muito sobre as implicações éticas da realização de testes clínicos em animais, especialmente cães. É de conhecimento de todos que existe em nosso meio espiritualista um considerável número de simpatizantes da causa de defesa dos animais, sendo a ecologia e o combate aos abusos e maus tratos uma bandeira frequentemente erguida por estes espiritualistas.

Não há dúvidas de que esta se trata de uma causa nobre, pois muitos em nosso meio concordam que nossa condição humana sendo melhor suprida de recursos se tornaria moralmente responsável pelos demais seres menos afortunados e portanto caberia a nós zelar por sua preservação e bem estar, sendo esta uma condição ideal.

O que se poderia contrapor a essa condição ideal é o fato de não vivermos em condições ideais e nossa realidade é bastante diversa desta tida como ideal. De modo que esta bandeira ideológica de lutar pelos direitos à vida e ao bem estar dos animais acaba caindo num juízo de valores bastante tendencioso, de modo que se faz distinções de espécies privilegiando aquelas com as quais nossa relação seja a de maior afeição.

Ou seja, se analisarmos com isenção de ânimo constataremos que em nossa sociedade humana fazemos uso, sim nós nos utilizamos dos animais das mais diversas e variadas formas. E todas as formas implicam em submeter esses seres a situações alheias às suas condições naturais.

Animais são utilizados para nosso lazer, para nos proporcionar vestimentas, alimentos, objetos etc. E nisto viemos a estabelecer uma escala de "simpatia" que temos para com cada espécie de acordo com o uso que fazemos delas, sendo que especialmente aqueles que são utilizados para o nosso lazer, como por exemplo cães acabam sendo tratados de maneira quase idêntica a que se trataria um ser humano.

Há quem diga que alguns animais seriam tratados melhor que muitos seres humanos, mas isso seria um equívoco, pois dar um tratamento humano, por melhor que seja a um animal não é fazer-lhe um bem, pois estará da mesma forma corrompendo sua natureza.

Deste modo, se buscarmos ter alguma imparcialidade podemos chegar facilmente a conclusão de que dar a um animal tratamento humano não é tratá-lo bem, pois tal modo de tratar faria bem a um humano e não estaria verdadeiramente atendendo às necessidades do animal.

Nesse ponto podemos agora considerar o contraponto da questão apresentado pelos representantes das Ciências Convencionais que com muito propriedade alertam para a questão de que dentre os inúmeros usos que damos aos animais, a utilização destes para testes laboratoriais seria de longe a de maior utilidade, sendo crucial para a melhoria e bem estar da própria vida humana.

Esta questão só entra em conflito quando os animais utilizados são aqueles que normalmente nos servem como fonte de lazer, conforto emocional e companhia, de modo que se estabelece um natural vínculo de simpatia pelo recorrente hábito de humanizar estes seres, ou seja, vê-los como análogos aos humanos.


Normalmente não nos detemos na observação de que criamos tais animais única e exclusivamente para satisfazer a nossas necessidades humanas, as diversas espécies de cães por exemplo foram criadas com propósitos muito específicos de nos prestar serviços, tais como caça, pastoreio, guarda, companhia etc. Se tirar toda uma espécie da natureza e alterá-la geneticamente para que melhor cumpram as tarefas que nos interessam não é um mau trato não saberia dizer o que seria então.

Imaginemos o inverso. Imaginemos que uma outra espécie criasse humanos, fazendo cruzamentos específicos para obter melhores corredores, ou escaladores por exemplo, ou para que se desenvolvesse características que aos olhos desses outros seres parecesse mais esteticamente interessante, como selecionar aqueles que tivessem mais ou menos pelos corporais, que tivessem tal ou qual cor e assim por diante.

Mesmo que nos dessem o que comer, nos dessem um espaço para viver da escolha deles e nos dessem atenção quando lhes fosse interessante, ainda assim não nos sentiríamos bem tratados. Então a idéia de que ao termos um animal doméstico estamos atendendo a todas as necessidades desse ser é ilusória.

Assim, é preciso que vejamos que dentre os diversos tipos de maus tratos que damos aos diversos animais que nos servem, caberá apenas considerar o que menos prejuízos irá trazer àquele ser, dentro daquilo que nos seja possível. Sendo que se tais criaturas foram criadas por nós para cumprir determinada função que ao menos essa tenha uma utilidade para nós que compense o sacrifício ao qual o animal é submetido para o nosso bem estar.

Da mesma forma que criamos animais para alimentação e produção de outros bens de consumo, assim também criamos animais para nosso lazer, bem como para nossos experimentos científicos para a criação de novos recursos na área médica e industrial. Mesmo em se tratando dos mesmos animais cada qual estará sendo criado com uma finalidade diferente.

Por exemplo há quem crie porcos não para alimentação mas sim para companhia, bem como eles também podem ser criados para a realização de experimentos. Da mesma maneira de acordo com o local e a cultura cães também estarão sendo criados para alimentação e não apenas para companhia e da mesma forma se cria cães para a realização de experimentos.

De todos os males que fazemos aos animais só nos cabe considerar causar o mínimo de impacto negativo e extrair o máximo proveito da função à qual os destinamos. E dentre essas diversas funções quer me parecer que poucas seriam tão nobres quanto sua utilização para garantir a segurança, saúde e bem estar do ser humano no consumo de medicamentos e outros bens de consumo.

Enfim vemos que os simpatizantes das causas protetoras dos animais devem com certeza se colocar em campo na vigilância de que estes seres não estejam sofrendo em vão, que tenham o máximo de bem estar possível no limite de sua utilização. Não cabendo a estas organizações o trabalho de redefinir a utilização atribuída ou ao que se destina a criação de cada espécie ou animal em particular.


Assim vejamos que utilizar um animal que foi criado para nos servir de companhia para alimentação seria algo inadequado, como também seria inadequado utilizar para companhia um animal que tivesse sido criado para servir de alimento, e isto se aplica igualmente ao desvio de função de um animal que tenha sido criado para a realização de testes clínicos, não servindo esse nem como alimento e nem como animal de estimação, sendo que isto sim se caracterizaria como um mau desnecessário. Da mesma forma que não deveriam estar sendo utilizados para nenhum desses fins animais selvagens, que tivessem sido retirados de sua condição natural.

Normalmente aplicamos esta lógica pragmática a todos os contextos, mas nos eventos recentes organizações de proteção aos animais estiveram deixando essa lógica de lado e tomando atitudes com base em sentimentalismos, por considerar que, no caso cães, só deveriam servir como companhia, deixando de levar em conta que em diversos povos e culturas eles são criados também para alimento e aqueles que estivessem servindo para a realização de testes clínicos teriam sido criados justamente com essa finalidade única.

Mas o caro leitor questionaria que este espaço se destina a assuntos atinentes às Ciências Ocultas e desta forma vou então trazer aqui alguns conceitos a serem levados em consideração dentro deste contexto.

Embora para as Ciências Convencionais o ser humano venha a ser considerado como uma espécie animal, este só é considerado assim por se estar considerando apenas e tão somente sua realidade física e corporal, de modo que de fato, os corpos humanos são corpos animais, embora no entanto, no estudo das Ciências Ocultas, que leva em consideração não apenas os corpos como também a entidade que o habita aí veremos uma distinção entre humanos e animais.

Pode parecer confuso, mas a questão não é de todo complexa, sendo que levamos em consideração a existência de diversos "Reinos", assim como conseguimos distinguir boa parte das vezes seres do Reino Animal de seres do Reino Vegetal, por possuírem corpos diferentes, assim também distinguimos seres do Reino Humano de seres do Reino Animal, embora essa distinção não seja feita pela observação dos corpos, mas de sua essência consciencial.

Assim o Reino Humano, mesmo sendo composto por seres de natureza consciencial distinta ainda assim se utilizam de corpos essencialmente animais. Assim observamos que há uma sensível diferença entre aquilo que seria benéfico ao ser Humano em essência daquilo que seria benéfico para os Animais como seres vivos.

Como utilizamos corpos animais, muito do que serve aos corpos de diversos animais também servirá para o corpo humano e em razão disto é que se torna possível para as Ciências Convencionais a realização de testes com corpos animais para se ter uma análise aproximada de como seria a reação dos corpos humanos naquelas mesmas condições.

Aí entraria a questão ética de se seria aceitável que pertencendo a um Reino se fizesse uso dos seres de outro, mas isso é observado na Natureza o tempo inteiro, de modo que Animais, assim como Humanos se utilizam de seres Vegetais, para Alimento, para Abrigo e outros fins, da mesma forma que seres Vegetais se utilizam de Animais e de Humanos em muitos casos para reprodução por exemplo.


Todas essas interações são Naturais e apenas a moral Humana é que nos leva a questionar tais questões. Especialmente por transferir aos demais seres características que lhe são particulares, tais como a maneira como lidamos com a dor e o sofrimento, que não é a mesma maneira com que os demais Reinos lidam.

Podemos levar em conta conceitos como sofrimento moral, que seria quase que exclusivamente humano. Animais por exemplo são capazes de sentir emoções, mas não vinculam nenhuma emoção específica à dor, a dor é simplesmente sentida fisicamente. No máximo se observa reações comportamentais instintivas, tais como medo por exemplo, criando-se assim o efeito traumático de se buscar evitar sentir aquela dor novamente.

Isto é diferente de uma decisão humana por não querer mais passar por tal situação, eles não tomam decisão nenhuma, trata-se de uma reação inconsciente, que aliás também possuímos. Deste modo é preciso que se leve em consideração que diferentemente dos Humanos os seres Animais não lidam de maneira emocional com a Morte, eles lidam de maneira mais natural como nós também deveríamos, sendo que a Morte em si não nos obriga a nenhuma resposta emocional específica e esta apenas se mostra como um condicionamento cultural que varia de acordo com a época e o povo em questão.

Outro ponto importante a ser observado na relação entre Humanos e Animais é que muitas escolas reencarnacionistas tratam do tema da reencarnação de Humanos em condições Animais e este é um processo que embora ocorra caberia se estabelecer uma distinção no uso do termo reencarnação, pois nestes casos não seria exatamente o mesmo processo de quando se retorna a uma encarnação Humana.

Este outro processo é conhecido como Metempsicose, que trata de aspectos um pouco mais obscuros de nossa constituição oculta consciencial. Nossa consciência tem como veículo de manifestação não apenas os corpos sutis como também a consciência e a memória dos átomos que compõem os corpos mais densos. Assim temos que certos conglomerados atômicos, veículos de consciência, que componham um corpo humano na hora de sua morte, poderá ocorrer destes migrarem e serem absorvidos e utilizados na constituição de corpos de Animais, ou mesmo de Vegetais, ou ainda outros Humanos.

Assim observa esse fenômeno no qual por vezes acessamos a memórias, tidas como reencarnatórias de experiências vividas nessa condição distinta de ter uma porção de si habitando outros corpos, de modo que isso demonstra que o processo reencarnatório é ainda mais complexo do se poderia supor.

Dentro dessas memórias encontramos também as sensações vividas, de modo que nos seria possível muitas vezes reviver a experiência, como dores, sofrimentos, emoções, pensamentos exatamente como ocorreria numa encarnação propriamente dita. Assim ocorre que em determinados meios se utiliza deste recurso da natureza para realizar "correções kármicas" submetendo o ser a experiências que de outra forma não teria como passar por elas, como de compartilhar de momentos de agonia de animais por exemplo.

Alguns se utilizariam disto como argumento para que abandonasse toda forma de utilização dos animais para evitar que "espíritos humanos" também sofram com eles, no entanto não só a morte como a própria dor fazem parte da natureza e apenas nossa postura anti-natural nos leva evitar tais coisas. Talvez tudo que precisemos seja realmente o conforto psicológico de que nosso mal é necessário.

sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Convite à Reflexão


Convido aqui aos leitores a que se permitam imaginar e acompanhar esta história que mesmo se tratando de uma ficção trará consigo elementos que ilustram nossos dias e a nossa relação com o Oculto.
 (Esta história é uma parábola e todos os dados objetivos e referências são fictícios)

 

A Saga dos Quiniguibalis

Existiu uma remota e pequenina ilha perdida na vastidão do Oceano Pacífico onde habitava um povo que dava a si mesmo o nome de Quiniguibali, o nome que davam à sua ilha era Niguibali, que em idioma nativo significava "todas as cores", davam este nome porque sua ilha possuía falésias multicoloridas e uma vegetação rica em flores dos mais diversos tipos então este nome lhe caía bem e assim por conseguinte o nome do povo significava "filhos de Niguibali".

Era um povo simples de vida pacata que há muitas gerações que não tinham contato com outros povos. Suas atividades principais além das interações sociais normais aos humanos consistiam em coletar alimentos, uma vez que a agricultura não supria todas as suas necessidades. Tinham um apetite especial por um tipo específico de marisco que gostavam de comer cozido.

Sim eles conheciam o fogo. Eram de mentalidade mediana, tinham inclusive uma gramática razoavelmente desenvolvida e uma escrita rudimentar somente dominada pelos anciões que guardavam sua história. Sabiam por exemplo que os últimos 43 anos foram de escassez do marisco que antes era abundante nas rochas de águas rasas, como também sabiam que a origem de seu povo provinha de uma terra distante para muito além das ondas do mar que os rodeava, em algum lugar seguindo em direção para onde o Sol nasce todas as manhãs, davam a esta terra o nome de Runiguibalis, significando "antiga Niguibalis" ou "antes de Niguibalis", os anciões não conseguiam chegar a um consenso sobre o sentido mais adequado para a partícula "ru", assim usavam o termo Runiguibalis também para definir a direção Leste, como também para se referirem ao Sol.

Ao marisco que apreciavam chamavam de Ru'qui, que tinha um significado de algo como "filho do leste", especialmente porque as áreas nas quais essa iguaria era coletada se encontravam nas praias que faziam frente para o Nascente, de modo que os coletores também eram chamados de Runiguibalis.

Com a escassez de Ru'qui os Runiguibalis (coletores de marisco), passaram a procurá-los em pedras submersas cada vez mais distantes da praia e ao longo de poucas gerações começou a ser preciso mergulhar grandes profundidades e permanecer prendendo o fôlego por períodos cada vez mais longos. Assim os Runiguibalis foram se tornando exímios mergulhadores capazes de alcançar profundidades que nenhum outro Quiniguibali seria capaz.


Sendo assim eles se tornaram os únicos capazes de alcançar o recife de coral que existia a uma considerável distância da praia e a cada vez que mergulhavam por ali ficavam maravilhados com a beleza das cores do coral e dos peixes e outros seres marinhos que viviam ali e voltavam contando sobre essas maravilhas da natureza, contando para os anciãos para que estes registrassem essa descoberta para as gerações seguintes. Isto era algo que tornava seu difícil trabalho um pouco mais prazeroso. Como não havia antecedentes linguísticos de uma nomenclatura para Coral eles chamaram de Finiguibalis, significando "pai de todas as cores", como sendo um superlativo da diversidade de cores que já conheciam, de modo que nunca haviam visto nada igual em terra.

Foram tempos de relativa fartura, pois a provisão de Ru'quis coletadas no coral era abundante, em pouco tempo os Runiguibalis foram aprendendo a coletá-los sem se cortarem no coral e evitando ouriços, moréias e águas vivas, para tirar dali o sustento de seu povo.

E assim foi se passando o tempo e geração após geração foi perdendo o interesse por Ru'quis a medida que a agricultura foi ficando mais desenvolvida. Assim a profissão de Runiguibali foi deixando de ser necessária e uns poucos agora já anciãos escreviam suas próprias histórias, embora de fato encontrassem grandes obstáculos em encontrar palavras e maneiras de descrever tudo aquilo que viam em seus mergulhos ao longo daquele recife tão cheio de vida.

Como existiam entre os anciãos muitos Runiguibalis, este termo passou a ser adotado também para definir o grupo de anciãos que guardava a história e orientavam e educavam as gerações mais novas. E é claro que contavam belas aventuras que tiveram em seus mergulhos ao recife.

Passaram-se muitas gerações mais até que não existisse mais nenhum mergulhador entre os anciãos de modo que o termo Runiguibali passou a definir apenas a distinta classe do conselho de anciãos daquele povo. Mas sua história foi registrada. Toda ela escrita em riqueza de detalhes.

Já nessa época os anciãos haviam conseguido fazer com que boa parte da população fosse capaz de ler e escrever, embora sua escrita fosse mais baseada em desenhos de modo que as explicações eram, como sempre foram, transmitidas por tradição oral.

Nenhum dos anciãos e nem mesmo nenhum dos jovens haviam jamais mergulhado fundo e distante o bastante para chegar se quer perto do recife, ninguém mais tinha o fôlego tão desenvolvido a ponto de ser capaz das proezas dos antigos mergulhadores. Portanto, tudo que lhes restava eram os relatos dos seus heróicos antepassados das histórias contatas pelos Runiguibalis (anciãos) que mesmo sem nunca terem mergulhado se consideravam mantenedores fiéis das antigas tradições.

Sabiam pelas suas antigas escrituras que quando o mar está revolto não é possível chegar até Finiguibali, sabiam que o sustento vinha de Finiguibali, que ele os provia a alimentava a todos com Ru'qui, e que somente um Runiguibali seria capaz de ver Finiguibali em toda a sua beleza de vida e cores e só por suas mãos viria o tão valioso Ru'qui.
 

Sem dúvida estas histórias ficavam um tanto confusas, já que as presentes gerações já haviam esquecido o que eram Ru'quis, e para eles Runiguibalis eram apenas e tão somente os Anciãos, e não seria difícil imaginar que qualquer compreensão clara do que seria Finiguibali estaria profundamente comprometida em vista de não ser possível a nenhum Quiniguibali moderno chegar a vê-lo.

Os antigos mergulhadores deixaram registrados detalhes interessantes como por exemplo um tipo de exercício respiratório que faziam para adquirir a capacidade de prender a respiração dentro d'água pelo tempo necessário, os anciãos mantiveram essa salutar prática sendo passada às novas gerações, pois este era o único meio de se chegar a Finiguibali.

A medida que a história foi sendo contada geração após geração a percepção do que seria Finiguibali foi se alterando e evitando que se perdesse essa informação se enfatizava e discursava sobre a importância e valor do "Pai de Todas as Cores", a explicação clara de que para encontrá-lo é essencial que se faça exercícios respiratórios, deixe o mar se acalmar e se voltar para Runiguibali, leste, a terra ancestral, a origem de nosso povo, de onde viemos, onde vive o grande Finiguibali, pai de todas as cores, pai de Niguibali, portanto criador de nossa ilha, os Quiniguibalis, "filhos de Todas as Cores" recebem o seu sustento do Pai, que mandou ao seu povo o Ru'qui, filho ancestral, filho do leste, filho do sol.

Sabiam que após um período de 43 anos de escassez os Runiguibalis encontraram Finiguibali e este lhes deu Ru'qui e o povo não teve mais fome e Finiguibali supriu suas necessidades desde então.

Os atuais Runiguibalis, anciãos e não mais os mergulhadores de antanho, quando a colheita era escassa faziam como estava escrito que os antigos Runiguibalis faziam, eles esperavam que o mar se acalmasse, faziam seus exercícios respiratórios e entravam no mar de frente para o nascente, deixando que as ondas os cobrissem e depois voltavam para a praia confiantes e com a sensação de missão cumprida, embora alguns até mesmo questionassem a utilidade de tal ato.

Ainda assim o povo continuava a admirar os seus atuais Runiguibalis, sabiam que eram uma classe especial de pessoa, que só sendo um deles se seria capaz de chegar a ver o grande Finiguibali, que só eles eram capazes de enfrentar as provas necessárias para trazer ao povo o sagrado Ru'qui que saciaria a fome de todos, pois os desafios para conseguir tal proeza consistiam em evitar que Finiguibali o ferisse, evitar também aqueles que viviam com Finiguibali, como eram os fantasmas da água (águas vivas), os espinhos de fogo (ouriços) e a serpente feroz (moréia).

Claro, nenhum dos Quiniguibalis atuais jamais viu tais seres, sua única referência era aquela contida em suas escrituras sagradas, contadas pelos Runiguibalis anciãos, e assim tudo que podiam fazer era imaginar tais situações, tais aventuras, ou mesmo imaginar toda a beleza e grandiosidade de Finiguibali.

Mas nem todos os Quiniguibalis tinham tanto respeito pelos Runiguibalis, existiam alguns que não viam utilidade prática nos exercícios respiratórios, não viam sentido na história de um ser multicolorido que vive na água e é nosso pai, parecia absurda a idéia dele mandar um filho especial para salvar o povo da fome e questionavam porque só os Runiguibalis eram capazes de vê-lo e porque só eles podiam trazer à terra o Ru'qui, filho ancestral do grande Finiguibali. (?)



Esses passaram a ser chamados de Afis, aqueles não acreditavam no Pai (Fi). Os Afis desafiavam os Runiguibalis, faziam seus discursos dizendo coisas como: "Porque não nos mostra Finiguibali? Porque não nos mostra o Ru'qui? Onde estão eles agora?" Pegavam cuias e enchiam de água para depois derramá-la ostensivamente bradando: "Está vendo?! Na água não há nada! Me mostre alguma criatura colorida nessa água!" e assim seguiam intermináveis discussões entre Runiguibalis e os Afis, assim como todos aqueles que eram simpatizantes e defensores da antiga tradição dos Runiguibalis, se sentiam indignados com os desrespeitosos questionamentos dos Afis.

Os Afis por muito tempo foram marginalizados e se mantinham isolados sem frequentar a grande cabana dos Runiguibalis, repudiando seus ensinamentos. Mas com o passar de algumas gerações foram adquirindo uma visibilidade maior e se organizando, buscando despertar o maior número de Quiniguibalis possível para que vissem o quão absurdas eram as práticas dos Runiguibalis.

Isso foi tornando os grupos de simpatizantes dos Runiguibalis, que então eram chamados de Runis, cada vez mais apaixonados e tinham acaloradas discussões nas quais os Afis diziam: "Finiguibali não existe! Não há provas de que exista tal coisa!"; ao que os Runis rebatiam afirmando: "Prove que ele não existe! Eu posso senti-lo em meu coração, as provas estão nas Escrituras" e ainda se estendiam falando do prazer que os Runiguibalis sentiam por estar em contato com Finiguibali e por descobrir seus mistérios. Os Afis se indignavam com a falta de lógica dos argumentos Runis e replicavam dizendo que "As escrituras não eram prova de nada, pois qualquer um poderia tê-las escrito e não eram especiais por isso, só contaram um amontoado de fantasias. E que já haviam vindo navegadores de outros povos vindos do Leste e nunca viram tal entidade e seria preciso ser muito tolo para acreditar na existência de tal coisa descrita de forma tão fantástica".

Havia ainda alguns grupos que se reuniam nas praias do leste para clamar por Finiguibali à espera de suas benesses e alguns até declaravam terem visto o grande Ru'qui em um fugaz relance. Enquanto os Afis questionavam a sanidade mental de tais indivíduos. Ao que os Runis consideravam um insulto à memória dos grandes Runiguibalis que morreram nos braços de Finiguibali por terem negligenciado os cuidados de evitar os fantasmas da água, os espinhos de fogo e a serpente feroz.

Também já se tinha notícia de um grupo isolado que se proclamavam seguidores da Serpente Feroz e igualmente eram contrários aos Runis, bem como aos Afis, e consideravam a Serpente Feroz uma antítese de Finiguibali, então eles se reuniam nas praias do oeste de noite quando mar estivesse mais revolto, acendiam uma fogueira e dançavam a noite inteira.

Certa vez havia uma discussão mais acalorada numa praia entre um grupo de Afis e um de Runis, enquanto um Quiniguibali solitário que assistia tudo isso comentou: "Essa discussão não faz sentido, pois o problema não está em se Finiguibali existe ou não, mas o que ele realmente é e em como as Escrituras estão sendo interpretadas, que certamente significavam algo diferente do que é entendido hoje", mas infelizmente nenhum dos dois lados lhe deu ouvidos, sendo que os Afis o consideraram como sendo apenas mais um dos "delirantes" Runis, enquanto os Runis o consideravam como mais um Afi querendo aprecer.
= Fim =
Adonai de Souza Jacino (Mammatus).
 


Não é por se tratar de uma parábola que esta não estará sendo um retrato do que vivemos hoje, onde temos religiosos, ateus e nossas sagradas escrituras sendo discutidas com base em interpretações dadas a coisas que não foram vividas senão por quem as escreveu. O ocultismo não trata de ocultar ou esconder conhecimentos, mas sim em desvendar o que já se encontra oculto.
 


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